sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Nos tempos da Ditadura



O samba de Aldir Blanc e João Bosco, gravado pela primeira vez por Elis Regina, em 1979, tornou-se, na prática, uma espécie de hino da luta pela anistia ampla, geral e irrestrita que ganhou grande impulso no Brasil e no exterior no final da década de 70.

No segundo semestre de 1979, diante do crescimento do clamor pela anistia, o novo presidente, general João Baptista Figueiredo, propôs ao Congresso a aprovação de uma lei inicialmente limitada apenas aos que não tivessem cometido “crimes de sangue”, o que excluía os que pegaram em armas contra o regime militar. Na prática, porém, as restrições foram sendo derrubadas pela pressão da sociedade e todos os presos, exilados e banidos políticos acabaram beneficiados.

Alguns esclarecimentos: a) provavelmente o verso “caía a tarde como um viaduto” é uma referência à súbita e inexplicada queda do viaduto Paulo de Frontin, no Rio de Janeiro, em 1971, no auge da ditadura militar; b)Henfil era um dos principais cartunistas do país e seu traço uma das mais importantes manifestações de resistência ao regime militar. Seu irmão Herbert de Souza, o Betinho, estava então exilado no Canadá. Depois de retornar ao Brasil, Betinho lideraria no anos 90 uma das maiores campanhas sociais do país, a campanha contra a fome; c) as Marias e Clarisses da música simbolizam as mulheres dos presos políticos mortos sob tortura. Clarisse é o nome da mulher do jornalista Vladimir Herzog; Maria, o da esposa do operário Manuel Fiel Filho. Os dois tinham sido assassinados sob tortura nas dependências do Exército, em São Paulo, nos anos anteriores.

Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto me lembrou Carlitos
A lua tal qual a dona do bordel

Pedia a cada estrela fria um brilho de aluguel
E nuvens lá no mata-borrão do céu
Chupavam manchas torturadas, que sufoco louco
O bêbado com chapéu coco fazia irreverências mil
Prá noite do Brasil, meu Brasil
Que sonha com a volta do irmão do Henfil
Com tanta gente que partiu num rabo de foguete

Chora a nossa pátria mãe gentil
Choram marias e clarisses no solo do Brasil
Mas sei que uma dor assim pungente não há de ser inutilmente
A esperança dança na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha pode se machucar
Azar, a esperança equilibrista
Sabe que o show de todo artista
tem que continuar

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